Trecho de um discurso

Phạm Văn Đồng

1955


Origem: discurso proferido na Conferência de Genebra, em 1955.

Fonte para a tradução: seção inglesa do Arquivo Marxista na Internet.

Tradução: Rick Magalhães de Sá.

HTML: João Victor Bastos Batalha.

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Ministro das Relações Exteriores da
República Democrática do Vietnã na
Conferência de Genebra

A política de intervenção na guerra da Indochina seguida pelos imperialistas americanos é uma parte componente da política de poder seguida pelos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial com o objetivo de dominar o mundo.

Com o enfraquecimento da França como resultado da guerra na Indochina, sua necessidade de ajuda americana para continuar esta guerra proporcionou oportunidade e condições para essa intervenção.

Com sua intervenção na Indochina, os imperialistas americanos seguiram com o objetivo de expulsar gradualmente os franceses da Indochina e transformá-la em uma colônia americana; apoderar-se da economia e dos recursos da região, suprimir o movimento nacional e democrático dos povos, transformar a Indochina em um trampolim para a conquista dos países do Sudeste Asiático, fazer dela uma base militar norte-americana. Ao intervir cada vez mais ativamente na guerra da Indochina, prolongando-a e expandindo-a, os imperialistas americanos tentaram, simultaneamente, salvar a economia americana da grave ameaça da crise que se tornou particularmente séria após a assinatura do armistício na Coreia.

A história dessa intervenção americana revela claramente os objetivos acima mencionados e as várias fases da intervenção, bem como os métodos que estão sendo utilizados para atingir esses objetivos.

Em agosto de 1947, um diplomata americano partiu para Hong Kong, e teve conversas com Bao Dai; mais tarde, em setembro de 1947, conversou com as autoridades francesas na Indochina e depois partiu para a França, onde se reuniu com o Governo Francês. Em dezembro de 1947, esse diplomata pediu a intervenção americana na Indochina: “Bao Dai deve ser reconhecido — ele declarou — e deve ser ajudado na formação de um exército”. Ele disse abertamente aos franceses: “Se a França não deseja tal decisão, os Estados Unidos devem tomar a questão em suas mãos”.

1950 foi marcado pela primeira fase de ampla intervenção dos imperialistas americanos na Indochina. Essa fase começou quando o Exército de Libertação Popular da China derrotou as forças armadas de Chiang Kai-shek e conquistou a libertação do vasto território chinês.

No início de 1950, após a visita de Philip C. Jessup à Indochina, decidiu-se enviar missões militares e econômicas americanas à região, e assistência militar foi prometida em troca da obrigação dos colonizadores franceses de estabelecer, em curto prazo, o chamado Governo Nacional, que teria seu próprio exército e seria investido de amplos poderes no campo das relações exteriores. A visita de Jessup resultou em declarações oficiais das autoridades americanas sobre suas intervenções na Indochina.

A pesada derrota no final de 1950 agravou a posição do Corpo Expedicionário Francês, que foi forçado a enfrentar ataques cada vez mais poderosos das forças armadas do povo vietnamita. Os intervencionistas americanos aproveitaram essa situação para intensificar sua intervenção na guerra na Indochina.

Em 1953, o Armistício na Coreia fez com que os imperialistas americanos prestassem mais atenção na Indochina. Os círculos dominantes americanos enfatizaram a “importância” da Indochina e a necessidade de fornecerem ajuda aos colonizadores franceses. O ano de 1953 foi também o ano de novos sucessos conquistados pelos povos de três países — Vietnã, Khmer e Pathet Lao — em quase todas as frentes. No mesmo ano, a resistência do povo francês à guerra na Indochina fez novos progressos, já que abraçou círculos mais amplos do povo e da opinião pública da França. Os imperialistas americanos tiraram proveito do fato de que os colonizadores franceses se encontravam numa situação desesperadora, da qual não havia escapatória: a intervenção assumiu a forma de concessão de novos créditos militares e da participação direta dos imperialistas americanos na direção estratégica das operações militares, em particular na elaboração e execução do plano Navarre.

Mas apesar da crescente intervenção americana na guerra, as tropas francesas sofreram derrotas consecutivas, enquanto os povos do Vietnã, Camboja e Laos continuaram a conquistar novas vitórias. Entre o fim de 1953 e início de 1954, as forças armadas do Vietnã, Khmer e Pathet Lao tornaram-se mais ativas em todas as áreas de operações e obtiveram novas vitórias consideráveis. O plano Navarre não só não conseguiu melhorar as condições do inimigo, como, pelo contrário, a fez piorar mais. E mais uma vez os imperialistas americanos tiraram proveito da situação para avançar mais em sua intervenção: em troca de conceder novos créditos militares, mais significativos para 1954, e de assistência substancial em aviação e pessoal para participação direta na aniquilação da população do Vietnã, Camboja e Laos, os americanos insistiram em sua participação no treinamento do chamado “Exército Nacional”.

As brilhantes vitórias dos povos da Indochina alcançadas ao longo dos últimos meses, o sucesso do movimento pela paz na França, as perspectivas do restabelecimento da paz pela Conferência de Genebra provocaram ansiedade entre os intervencionistas americanos. Eles inventam novos planos (o plano de “ações comuns”, de “segurança coletiva” ...) para prolongar e estender a guerra na Indochina em cumplicidade com os defensores franceses de levar a guerra até o fim. Esta política de força e guerra provocou protestos dos povos e dos governos de vários países do Sudeste Asiático.

Para justificar essa política de força e guerra, os intervencionistas americanos se referem à defesa dos Estados Unidos, do Sudeste Asiático e da própria liberdade.

Defesa dos Estados Unidos? Então nós, povos da Indochina, constituímos uma ameaça aos Estados Unidos. Nenhuma pessoa razoável pode imaginar tamanha extravagância por um instante.

Defesa do Sudeste Asiático? De fato, a paz e a segurança do Sudeste Asiático e da Ásia estão realmente ameaçadas, não pelos povos da Indochina, ou qualquer país asiático, mas, na verdade, pelos imperialistas americanos.

Defesa da liberdade? Somos nós, os povos oprimidos da Indochina, os povos oprimidos da Ásia, os povos oprimidos do mundo inteiro, que somos os mais ardentes e consistentes defensores de nossa liberdade, da liberdade para todos os povos escolherem seu regime político contra qualquer ameaça de subjugação imperialista.

A evolução da intervenção americana na guerra na Indochina revela os seguintes fatos.

Os imperialistas americanos transformaram a França, por um lado, em um instrumento de sua política e, por outro, prepararam sua expulsão da Indochina. Mas os círculos franceses, advogando a guerra impiedosa na sua cegueira política, desejam a continuação da guerra. Para continuar o conflito, eles precisam da ajuda americana, e assim se submetem aos intervencionistas americanos, que assumirão, no momento oportuno, o fardo de “substituírem” os franceses, caso estes se mostrem impotentes ou obstinados. Por outro lado, os imperialistas americanos, que obrigam os franceses a continuar a guerra na Indochina, tentam enfraquecer a França para subjugá-la ainda mais na Europa.

Este é o primeiro aspecto da intervenção americana.

Os outros aspectos são o estabelecimento do chamado regime nacional, ao qual se sugere que a França conceda uma “independência” completa. O estabelecimento do então chamado Governo Nacional, bem como a formação de um exército “nacional” que deveria existir separadamente do Corpo Expedicionário Francês — estes são os termos impostos pelos imperialistas americanos aos colonizadores franceses em troca de sua ajuda militar.

Esses termos lhes dão a oportunidade de colocar sob seu próprio controle os então chamados governos e exércitos nacionais, para completar sua substituição pelos franceses, para realizar plenamente sua política “usar os indochineses contra os indochineses” e intensificar e estender as ações militares.

Os círculos dominantes dos Estados Unidos exercem toda a pressão sobre a França, visando a extensão da guerra na Indochina, exigindo o envio de novos contingentes de tropas francesas e africanas, legionários, e mercenários de todos os tipos, incluindo até hitleristas.

Os círculos imperialistas dos Estados Unidos e da França buscam, dessa forma, prolongar a guerra para lucrar às custas do sangue derramado por outros.

Eles contam em arrastar outros países para a guerra. O objetivo de tudo isso é prolongar e estender a guerra com o objetivo de transformar a Indochina e países próximos em colônias americanas. Porém, a heroica resistência dos povos da Indochina frustrou esses planos. Essa resistência torna-se cada dia mais poderosa e eficaz. A situação militar do inimigo é agora mais difícil do que nunca, principalmente após a grande vitória em Dien Bien Phu conquistada pelo Exército Popular da República Democrática do Vietnã, na véspera desta conferência; a importância dessa vitória não pode ser ignorada por ninguém. Os povos unidos da Indochina, convencidos de seus direitos, estão determinados a lutar para frustrar os planos dos intervencionistas americanos.

É por isso que os intervencionistas americanos e os franceses partidários da guerra até o fim são hoje o principal obstáculo ao fim da guerra e ao restabelecimento da paz.

Os intervencionistas americanos que buscam prolongar e estender a guerra na Indochina induzem vários países a participarem da guerra, criando assim uma nova ameaça à paz na Ásia e em todo o mundo.

Esta política de agressão e estas provocações militares são contrárias aos interesses dos povos do Vietnã, Camboja e Laos, além de também serem contrárias aos interesses dos povos franceses e americanos.

Os povos do Vietnã, Camboja e Laos desejam paz, independência, união e democracia. Desejam estabelecer relações amigáveis com os povos de todo o mundo. Seus anseios correspondem aos interesses de todos os povos do mundo.

A causa dos povos do Vietnã, Camboja e Laos, que é a causa da paz, inevitavelmente triunfará.